23 de Abril de 2018 - Treze organizações de diversos países enviaram à ANACOM uma participação que demonstra que as práticas de zero-rating em Portugal são das piores da Europa e que isso se reflecte negativamente nos serviços de acesso a Internet móvel que são disponibilizados aos portugueses. As organizações signatárias pedem à ANACOM que defenda a neutralidade da Internet e imponha as regras europeias que garantem aos cidadãos uma Internet livre e aberta.
"Portugal tem as piores violações da neutralidade da Internet que alguma vez vimos na Europa. É difícil imaginar como poderia um regulador independente achar que tais práticas não vão contra a lei europeia”, diz Thomas Lohninger, Director Executivo da epicenter.works, uma organização austríaca integrante da European Digital Rights (EDRi). "Nesta queixa apresentamos evidências legais e económicas de que, seguindo os vários critérios das regras europeias, essas ofertas deveriam ser proibidas", acrescenta.
A legislação da União Europeia para a Neutralidade da Internet, que protege o direito dos cidadãos europeus a terem uma Internet livre e aberta, entrou em vigor há já dois anos, em Abril de 2016. Ainda a nível europeu, o BEREC (Body of European Regulators for Electronic Communications) emitiu directrizes para clarificar alguns aspectos. Mas apesar destas directrizes, a violação da neutralidade da Internet tem estado em crescendo nos últimos tempos, nomeadamente devido às ofertas de zero-rating, nos tarifários de Internet móvel. Estas ofertas tornam a utilização de algumas aplicações mais cara que outras. Até agora, nenhum regulador europeu tinha decidido intervir contra estas ofertas, apesar de ter autoridade para o fazer.
Em Portugal, os três maiores operadores MEO, Vodafone and NOS, possuem uma quota combinada superior a 95% do mercado. Todos oferecem soluções de zero-rating que dão tratamento preferencial a empresas dominantes na Internet, como a Google ou Facebook. Ao mesmo tempo, Portugal figura nos últimos lugares da Europa no que respeita ao preço e disponibilidade de volume de tráfego de Internet móvel, enquanto as ofertas de zero-rating e similares são bastante mais baratas que os outros pacotes de dados que são disponibilizados aos portugueses. Estas empresas decidem, num processo nada transparente, que serviços de Internet são incluídos nas suas ofertas de zero-rating.
A 28 de Fevereiro de 2018, a ANACOM publicou o seu "Sentido provável de decisão", considerando existirem ofertas destas operadoras que violam as regras da neutralidade da rede e dando 40 dias úteis a MEO, NOS e Vodafone para alterarem as ofertas. Ao mesmo tempo, foi aberto um processo de consulta pública, e 13 organizações de vários países entregaram uma participação conjunta em que apresentam evidências estatísticas, com base em dados da Comissão Europeia, de como o zero-rating tem um efeito negativo no preço do serviço de acesso à Internet. "Em geral, os preços dos volumes de dados na Europa caíram 8% entre 2015 e 2016, excepto nos mercados em que são oferecidos produtos com zero-rating. Nesses mercados, o preço subiu 2%", diz Thomas Lohninger.
Eduardo Santos, Presidente da Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais, considera que o zero-rating "prejudica todos os consumidores e está a fazer com que Portugal esteja na cauda da Europa em termos de preço e disponibilidade de volume de dados móveis". Sobre a decisão da ANACOM, esta "peca por tardia, e podia ir mais longe, sendo precisamente esse um dos aspectos em que se foca a nossa participação". Acrescenta ainda que "é incompreensível como, dois anos depois, Governo e Assembleia da República ainda não alteraram a legislação de forma a permitir à ANACOM punir estas violações por parte dos prestadores de serviço. Até que isso aconteça, todas as violações da neutralidade da Internet em Portugal vão continuar a sair impunes, e o nosso país continuará a figurar como referência a nível internacional em violações de neutralidade da rede".
A participação foi co-redigida pela Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais e epicenter.works, tendo também como signatários:
Capítulo Português da Internet Society, Portugal
European Digital Rights (EDRi), europeia
Access Now, internacional
Bits of Freedom, Holanda
Chaos Computer Club, Alemanha
Electronic Frontier Fundation Finland, Finlândia
Fitug, Alemanha
Hermes Center, Itália
IT-Pol, Dinamarca
Open Media, Canadá
X-Net, Espanha
Download da participação no âmbito da consulta pública da ANACOM relativa a práticas comerciais de zero-rating e similares em Portugal.
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